Capítulo 101
DESCRIÇÃO DO REI IDEAL (72; 2 Sm 23,1-7)
É considerado um salmo real, apesar de nenhuma das suas expressões ser exclusivamente ligada à realeza; uma espécie de declaração de princípios destinados a guiar a conduta do rei como figura central e modelar da ética colectiva. Esta oração tinha provavelmente lugar numa cerimónia litúrgica. O texto, espelhando uma sociedade ideal, consente ressonâncias messiânicas. O ritmo literário de elegia sugere uma composição tardia.
- 1De David. Salmo.
-
Quero cantar o amor e a justiça;
- para ti, SENHOR, hei-de cantar.
-
2Quero seguir pelos caminhos da honestidade:
- quando virás ao meu encontro?
- Procederei honestamente com os da minha casa.
-
3Não porei diante dos meus olhos acções iníquas;
- odeio os caminhos dos que praticam o mal;
- não me deixarei contagiar por eles.
-
4Longe de mim, o coração perverso;
- não quero saber do homem mau.
-
5Hei-de reduzir ao silêncio
- o que, às ocultas, calunia o seu semelhante;
- não hei-de tolerar o arrogante e orgulhoso de coração.
-
6O meus olhos procurarão gente fiel do meu país,
- para viver junto de mim;
-
só aquele que segue pelo caminho honrado
- poderá estar ao meu serviço.
-
7O homem fraudulento não habitará em minha casa;
- o mentiroso não terá assento junto de mim.
-
8Cada manhã hei-de julgar severamente
- todos os ímpios deste país,
-
para exterminar da cidade do SENHOR
- todos os malfeitores!
Capítulo 102
Súplica individual feita em espírito de penitência. Mas os v.13-23 introduzem uma súplica colectiva por Sião. Isto faz pensar que todo o resto do salmo, apesar de estar no singular, soava perfeitamente acomodado a cada “eu” do povo ou a um “eu” colectivo. Daí a pertinência do seu uso litúrgico. A súplica por Sião tem tons claramente pós-exílicos e partilha do espírito do sentido de Is 40-66.
-
1Oração de um aflito que na sua miséria expõe a sua angústia
- diante do SENHOR.
-
2SENHOR, escuta a minha oração
- e chegue junto de ti o meu clamor!
-
3Não me ocultes o teu rosto no dia da aflição.
- Inclina para mim o teu ouvido;
- no dia em que te invocar, responde-me sem demora!
-
4Porque os meus dias se desvanecem como fumo
- e os meus ossos ardem como um braseiro.
-
5Como a erva cortada, o meu coração está ressequido;
- até me esqueço de comer o meu pão.
-
6À força de tanto gemer,
- os ossos colaram-se à minha pele.
-
7Tornei-me semelhante ao pelicano no deserto;
- sou como a coruja nas ruínas abandonadas.
-
8Não consigo dormir e suspiro;
- sou como um pássaro solitário sobre um telhado.
-
9Os meus inimigos insultam-me todo o dia,
- e com furor proferem imprecações contra mim.
-
10Em vez de pão, como cinza
- e misturo a minha bebida com lágrimas,
-
11por causa da tua indignação e do teu furor;
- fizeste-me subir, para depois me rejeitares.
-
12Os meus dias são como a sombra que declina
- e eu vou secando como a erva.
-
13Tu, porém, SENHOR, permaneces para sempre
- e o teu nome será lembrado por todas as gerações.
-
14Levanta-te, tem piedade de Sião;
- já é tempo de lhe perdoares.
-
15Os teus servos amam as suas pedras,
- sentem pena das suas ruínas.
-
16Os povos honrarão, SENHOR, o teu nome,
- e todos os reis da terra, a tua majestade.
-
17Quando o SENHOR reconstruir Sião
- e manifestar a sua glória,
-
18há-de voltar-se para a oração do indigente
- e não desprezará as suas súplicas.
-
19Escrevam-se estas coisas para as gerações futuras,
- e os que hão-de nascer louvarão o SENHOR.
-
20O SENHOR observa do alto do seu santuário;
- lá do céu, Ele olha para a terra,
-
21para escutar os gemidos dos cativos
- e livrar os condenados à morte.
-
22Em Sião será anunciado o nome do SENHOR,
- e em Jerusalém, a sua glória,
-
23quando os povos de todas as nações se reunirem
- para servirem o SENHOR.
-
24Ele deixou-me sem forças no caminho
- e abreviou os meus dias.
-
25«Meu Deus, eu te peço:
- não me leves a meio dos meus dias!»
- Os teus anos duram por todas as gerações.
-
26Tu fundaste a terra desde o princípio
- e os céus são obra das tuas mãos.
-
27Eles deixarão de existir, mas Tu permanecerás;
- tal como um vestido, eles vão-se gastando;
- como um vestido que se muda, assim eles desaparecem.
-
28Mas Tu permaneces sempre o mesmo,
- os teus anos não têm fim.
-
29Os filhos dos teus servos hão-de viver tranquilos
- e a sua descendência perdurará na tua presença.
Capítulo 103
HINO AO DEUS DE AMOR (Sir 18,8-14)
Este salmo tem o espírito e a ressonância de um hino em honra de Deus, além de um estilo muito pessoal e íntimo. O actual texto pode ter nascido de um salmo de acção de graças individual. De facto, este salmo representa um hino de louvor a Deus pelo seu amor eterno e cuidadoso, um verdadeiro “Te Deum” do AT.
- 1De David.
-
Bendiz, ó minha alma, o SENHOR,
- e todo o meu ser louve o seu nome santo.
-
2Bendiz, ó minha alma, o SENHOR,
- e não esqueças nenhum dos seus benefícios.
-
3É Ele quem perdoa as tuas culpas
- e cura todas as tuas enfermidades.
-
4É Ele quem resgata a tua vida do túmulo
- e te enche de graça e de ternura.
-
5É Ele quem cumula de bens a tua existência
- e te rejuvenesce como a águia.
-
6O SENHOR defende, com justiça,
- o direito de todos os oprimidos.
-
7Revelou os seus caminhos a Moisés
- e as suas maravilhas aos filhos de Israel.
-
8O SENHOR é misericordioso e compassivo,
- é paciente e cheio de amor.
-
9Não está sempre a repreender-nos,
- nem a sua ira dura para sempre.
-
10Não nos tratou segundo os nossos pecados,
- nem nos castigou segundo as nossas culpas.
-
11Como é grande a distância dos céus à terra,
- assim são grandes os seus favores para os que o temem.
-
12Como o Oriente está afastado do Ocidente,
- assim Ele afasta de nós os nossos pecados.
-
13Como um pai se compadece dos filhos,
- assim o SENHOR se compadece dos que o temem.
-
14Na verdade, Ele sabe de que somos formados;
- não se esquece de que somos pó da terra.
-
15Os dias dos seres humanos são como a erva:
- brota como a flor do campo,
-
16mas, quando sopra o vento sobre ela,
- deixa de existir e não se conhece mais o seu lugar.
-
17Mas o amor do SENHOR é eterno para os que o temem
- e a sua justiça chega até aos filhos dos seus filhos,
-
18para os que guardam a sua aliança
- e se lembram de cumprir os seus preceitos.
-
19O SENHOR estabeleceu nos céus o seu trono
- e o seu reino estende-se a tudo o que existe.
-
20Bendizei o SENHOR, todos os seus anjos,
- poderosos mensageiros, que cumpris as suas ordens,
- sempre dóceis à sua palavra.
-
21Bendizei o SENHOR, todo o seu exército de astros,
- que sois seus servos e executores da sua vontade.
-
22Bendizei o SENHOR, todas as suas obras,
- em todos os lugares do seu domínio.
- Bendiz, ó minha alma, o SENHOR!
Capítulo 104
HINO AO CRIADOR DO UNIVERSO (8; Sir 43)
Hino e meditação. Descreve o cuidado e a atenção com que Deus governa este universo em que decorre a vida humana, dia a dia. Partilha alguns dos temas da criação que se prolonga no nascer e morrer de cada dia. Este tema da vida quotidiana integrada na fé em Deus é uma categoria básica da experiência humana que se espelha nas culturas do Médio Oriente Antigo. Por isso, este salmo tem textos análogos aos das literaturas da época. Um hino muito semelhante é o que o faraó Amenófis IV do Egipto dedicou ao Sol, Aton.
-
1Bendiz, ó minha alma, o SENHOR!
- SENHOR, meu Deus, como Tu és grande!
- Estás revestido de esplendor e majestade!
-
2Estás envolto num manto de luz
- e estendeste os céus como um véu.
-
3Fixaste sobre as águas a tua morada,
- fazes das nuvens o teu carro,
- caminhas sobre as asas do vento.
-
4Fazes dos ventos teus mensageiros,
- e dos relâmpagos, teus ministros.
-
5Fundaste a terra sobre bases sólidas,
- ela mantém-se inabalável para sempre.
-
6Tu a cobriste com o manto do abismo
- e as águas cobriram as montanhas;
-
7mas, à tua ameaça, elas fugiram,
- ao fragor do teu trovão, estremeceram.
-
8Ergueram-se as montanhas, cavaram-se os vales
- nos lugares que lhes determinaste.
-
9Puseste limites às águas, para não os ultrapassarem,
- e nunca mais voltarem a cobrir a terra.
-
10Transformas as fontes em rios,
- que serpenteiam entre as montanhas.
-
11Eles dão de beber a todos os animais selvagens,
- neles matam a sede os veados dos montes.
-
12Os pássaros do céu vêm morar nas suas margens;
- ali chilreiam entre a folhagem.
-
13Das tuas altas moradas regas as montanhas;
- com a bênção da chuva sacias a terra.
-
14Fazes germinar a erva para o gado
- e as plantas úteis para o homem,
- para que da terra possa tirar o seu alimento:
-
15o vinho, que alegra o coração do homem,
- o azeite, que lhe faz brilhar o rosto,
- e o pão, que lhe robustece as forças.
-
16Matam a sua sede as árvores do SENHOR,
- os cedros do Líbano que Ele plantou.
-
17Nelas fazem ninho as aves do céu;
- a cegonha constrói a sua casa nos ciprestes.
-
18Os altos montes são abrigo para as cabras,
- e os rochedos, para os animais roedores.
-
19A Lua cumpre as várias estações
- e o Sol conhece o seu ocaso.
-
20Tu estendes as trevas e faz-se noite,
- nela vagueiam todos os animais da selva.
-
21Rugem os leões em busca da presa,
- pedindo a Deus o seu alimento.
-
22Mas, ao nascer do Sol, logo se retiram,
- para se recolherem nos seus covis.
-
23Então o homem sai para o trabalho
- e moureja até anoitecer.
-
24SENHOR, como são grandes as tuas obras!
- Todas elas são fruto da tua sabedoria!
- A terra está cheia das tuas criaturas!
-
25Lá está o mar, grande e vasto,
- onde se agitam inúmeros seres,
- animais grandes e pequenos.
-
26Nele passam os navios e ainda o Leviatan,
- monstro que Tu criaste, para ali brincar.
-
27Todos esperam de ti
- que lhes dês comida a seu tempo.
-
28Dás-lhes o alimento, que eles recolhem,
- abres a tua mão e saciam-se do que é bom.
-
29Se deles escondes o rosto, ficam perturbados;
- se lhes tiras o alento, morrem
- e voltam ao pó donde saíram.
-
30Se lhes envias o teu espírito, voltam à vida.
- E assim renovas a face da terra.
-
31Glória ao SENHOR por toda a eternidade!
- Que o SENHOR se alegre em suas obras!
-
32Ele olha para a terra e ela estremece,
- toca nos montes e eles fumegam.
-
33Cantarei ao SENHOR, enquanto viver;
- louvarei o meu Deus, enquanto existir.
-
34Que o meu cântico lhe seja agradável,
- pois no SENHOR encontro a minha alegria.
-
35Desapareçam da terra os pecadores!
- Os ímpios deixem de existir!
- Bendiz, ó minha alma, o SENHOR!
- Aleluia!
Capítulo 105
DEUS E A HISTÓRIA DE ISRAEL (78; 1 Cr 16,8-22)
Meditação histórica, em tonalidades de hino, como o Sl 78. O facto de parte deste salmo aparecer citado em 1 Cr 16,8-22 é sinal de que era utilizado na liturgia, em ligação com a passagem da Arca da aliança para o monte Sião. Mas quase todo ele está voltado para a História do povo, cujos momentos principais recapitula: patriarcas (8-15), José‚ (16-23), Moisés (24-27), pragas do Egipto (28-36), Êxodo (37-43) e chegada a Canaã (44-45).
-
1Louvai o SENHOR, aclamai o seu nome,
- anunciai entre os povos as suas obras.
-
2Cantai-lhe hinos e salmos,
- proclamai as suas maravilhas.
-
3Orgulhai-vos do seu nome santo;
- alegre-se o coração dos que procuram o SENHOR.
-
4Recorrei ao SENHOR e ao seu poder
- e buscai sempre a sua face.
-
5Recordai as maravilhas que Ele fez,
- os seus prodígios e as sentenças da sua boca,
-
6vós, descendentes de Abraão, seu servo,
- filhos de Jacob, seu escolhido.
-
7Ele é o SENHOR, nosso Deus,
- e governa sobre a terra!
-
8Ele recordará sempre a sua aliança,
- a promessa que jurou manter por mil gerações,
-
9o pacto que fez com Abraão
- e aquele juramento que fez a Isaac.
-
10Confirmou-o como um preceito para Jacob,
- como aliança eterna para Israel,
-
11quando disse: «Dar-te-ei a terra de Canaã,
- como a parte que vos cabe em herança.»
-
12Quando ainda eram muito poucos
- e estrangeiros, na terra de Canaã,
-
13quando emigravam de nação em nação
- e passavam de um reino para outro,
-
14Ele não permitiu que alguém os oprimisse
- e castigou reis por causa deles:
-
15«Não toqueis nos meus ungidos,
- não maltrateis os meus profetas.»
-
16Fez, depois, cair a fome sobre a terra
- e privou-os do pão, que dá o sustento.
-
17Enviou diante deles um homem,
- José, que foi vendido como escravo.
-
18Apertaram-lhe os pés com grilhões
- e puseram-lhe uma argola de ferro ao pescoço,
-
19até que se cumpriu a profecia,
- e a palavra do SENHOR lhe deu razão.
-
20Então o rei deu ordens para que o soltassem,
- o soberano dos povos pô-lo em liberdade.
-
21Nomeou-o mordomo da sua casa
- e administrador de todos os seus bens,
-
22com poderes para instruir os seus príncipes
- e para ensinar a sabedoria aos anciãos.
-
23Foi então que Israel entrou no Egipto
- e Jacob foi viver no país de Cam.
-
24Deus multiplicou grandemente o seu povo
- e tornou-o mais forte que os seus inimigos.
-
25Mudou-lhes o coração e eles odiaram o povo de Deus
- e trataram com perfídia os seus servos.
-
26Deus enviou então o seu servo Moisés
- e Aarão, seu escolhido,
-
27que realizaram maravilhas no meio deles
- e milagres no país de Cam.
-
28Mandou as trevas e tudo escureceu,
- mas eles não fizeram caso das suas palavras.
-
29Converteu em sangue as águas dos rios
- e matou todos os peixes.
-
30Encheu-lhes a terra de rãs,
- mesmo no interior dos palácios do rei.
-
31Deus ordenou e apareceram nuvens de insectos
- e mosquitos por todo o território.
-
32Em vez de chuva, enviou-lhes granizo
- e chamas de fogo sobre todo o país.
-
33Destruiu as suas vinhas e figueiras,
- destroçou as árvores dos campos.
-
34Deus ordenou e apareceram os gafanhotos,
- com larvas em número incontável,
-
35que devoraram toda a verdura dos campos
- e comeram os frutos das suas terras.
-
36Feriu de morte os primogénitos do país,
- as primícias da sua juventude.
-
37Fê-los sair com prata e ouro,
- e não houve um único doente nas suas tribos.
-
38Alegrou-se o Egipto com a sua saída,
- pois andavam aterrados com eles.
-
39Deus estendeu uma nuvem para os proteger
- e com um fogo iluminava-os de noite.
-
40A seu pedido, deu-lhes codornizes
- e saciou-os com o pão do céu.
-
41Fendeu o rochedo e brotou água,
- que pelos areais correu como um rio.
-
42Deus lembrou-se da sua palavra sagrada,
- que tinha dado a Abraão, seu servo,
-
43e fez sair o seu povo com alegria
- e os seus eleitos com gritos de júbilo.
-
44Deu-lhes as terras dos pagãos
- e eles herdaram as riquezas desses povos,
-
45na condição de guardarem os seus preceitos
- e observarem as suas leis.
- Aleluia!
Capítulo 106
CONFISSÃO NACIONAL DE ISRAEL (78; 105)
Salmo colectivo de súplica. Pede perdão pelos pecados cometidos. Esta confissão comunitária é feita como um exame de consciência à História do povo. Daí a semelhança entre certos aspectos deste salmo e os Sl 78 e 105. Os últimos versículos situam-no provavelmente depois do Exílio.
- 1Aleluia!
-
Dai graças ao SENHOR, porque Ele é bom,
- porque o seu amor é eterno.
-
2Quem poderá contar as obras do SENHOR
- e apregoar todos os seus louvores?
-
3Felizes os que observam os seus preceitos
- e fazem sempre o que é justo.
- 4Lembra-te de mim, SENHOR,
-
por amor do teu povo.
- Vem trazer-me a tua salvação,
-
5para eu ver a felicidade dos teus escolhidos,
- rejubilar com a alegria do teu povo
- e orgulhar-me com a tua herança.
-
6Pecámos, como os nossos pais,
- fomos ímpios e pecadores.
- 7Os nossos pais, quando estavam no Egipto,
-
não entenderam as tuas maravilhas
- nem tiveram presente a imensidade do teu amor;
- revoltaram-se junto ao Mar dos Juncos.
-
8Mas Ele salvou-os, por amor do seu nome,
- e para mostrar o seu poder.
-
9Ameaçou o Mar dos Juncos e ele secou,
- e conduziu-os pelas profundezas como por um deserto.
-
10Salvou-os das mãos dos que os odiavam
- e resgatou-os do poder dos inimigos.
-
11As águas cobriram os seus perseguidores;
- nem um só deles escapou com vida.
-
12Então acreditaram na sua palavra
- e cantaram os seus louvores.
-
13Mas depressa esqueceram as suas obras
- e não confiaram nos seus planos.
-
14Cederam aos seus instintos, no deserto,
- e provocaram a Deus, no descampado.
-
15Deus concedeu-lhes o que pediam
- e enviou-lhes o alimento até se saciarem.
-
16No acampamento, tiveram inveja de Moisés
- e de Aarão, o ungido do SENHOR.
-
17Abriu-se então a terra, que engoliu Datan
- e sepultou os sequazes de Abiram;
-
18o fogo consumiu os seus partidários
- e as chamas devoraram os malvados.
-
19Fizeram um bezerro de ouro no Horeb
- e adoraram um ídolo de metal fundido.
-
20Trocaram assim o seu Deus glorioso
- pela figura de um animal que come feno.
-
21Esqueceram a Deus, que os salvara,
- que realizara prodígios no Egipto,
-
22maravilhas no país de Cam,
- feitos gloriosos no Mar dos Juncos.
-
23Deus decidiu aniquilá-los.
- Moisés, porém, seu escolhido,
-
intercedeu junto dele,
- para acalmar a sua ira destruidora.
-
24Eles desprezaram a terra de delícias;
- não acreditaram na sua palavra.
-
25Murmuraram nas suas tendas
- e desobedeceram às ordens do SENHOR.
-
26Por isso, jurou-lhes, de mão erguida,
- que os deixaria morrer no deserto
-
27e que dispersaria os seus descendentes,
- espalhando-os entre os pagãos, por toda a terra.
-
28Entregaram-se depois a Baal-Peor
- e comeram dos sacrifícios oferecidos aos mortos.
-
29Provocaram-no com os seus crimes;
- por isso, a peste irrompeu entre eles.
-
30Surgiu então Fineias, que fez justiça
- e a peste acabou.
-
31Esse gesto foi-lhe reconhecido como mérito,
- por todas as gerações e para sempre.
-
32Irritaram-no junto das águas de Meribá
- e, por culpa deles, Moisés foi castigado,
-
33porque lhe amarguraram o espírito
- e ele proferiu palavras insensatas.
-
34Não exterminaram os povos pagãos,
- como o SENHOR lhes tinha ordenado;
-
35em vez disso, misturaram-se com esses povos
- e aprenderam os seus costumes.
-
36Prestaram culto aos seus ídolos,
- que foram para eles uma armadilha.
-
37Imolaram os seus filhos e as suas filhas
- em sacrifício aos demónios.
-
38Derramaram sangue inocente,
- o sangue de seus filhos e filhas
-
sacrificados aos ídolos de Canaã,
- e a terra ficou manchada de sangue.
-
39Contaminaram-se com os seus actos,
- prostituíram-se com os seus crimes.
-
40Por isso, o SENHOR se indignou com o seu povo
- e ficou desgostoso com a sua herança.
-
41Entregou-os ao poder dos pagãos
- e foram dominados pelos que os odiavam.
-
42Os seus inimigos oprimiram-nos
- e foram vergados ao seu poder.
-
43Muitas vezes Deus os libertou,
- mas eles mostraram-se rebeldes nos seus caprichos
- e mergulharam sempre mais na sua maldade.
-
44Contudo, Ele reparou na sua aflição
- e ouviu os seus lamentos.
-
45Recordou-se deles por causa da sua aliança
- e teve pena deles, pelo seu grande amor.
-
46Por isso, fê-los encontrar clemência
- junto dos seus conquistadores.
-
47Salva-nos, SENHOR, nosso Deus,
- e volta a reunir-nos de entre os pagãos,
-
para darmos graças ao teu santo nome
- e celebrarmos os teus louvores.
- 48Bendito seja o SENHOR, Deus de Israel,
-
pelos séculos dos séculos.
- E todo o povo diga: «Ámen! Aleluia!»
Capítulo 107
DEUS, SALVADOR DE TODOS OS PERIGOS
Salmo de acção de graças, aqui apresentado num solene contexto litúrgico. O carácter litúrgico nota-se na dupla série de refrães que o entrecorta (v.6, 13, 19, 28 e ainda 8, 15, 21, 31). Esta grande solenidade das fórmulas e das recordações históricas referidas dariam ao salmo um sentido de acção de graças colectivo. É, no entanto, frequente catalogá-lo como salmo individual de acção de graças. Na verdade, a separação entre o individual e o colectivo na acção não é fácil de fazer nem terá grande utilidade.
-
1Dai graças ao SENHOR, porque Ele é bom,
- porque o seu amor é eterno.
-
2Digam-no aqueles que o SENHOR resgatou,
- os que Ele libertou do poder do inimigo
-
3e fez regressar de todas as terras,
- do Oriente e do Ocidente, do Norte e do Sul.
-
4Andaram errantes pelo deserto e pela solidão,
- sem encontrar caminho para uma cidade onde habitar.
-
5Tinham fome e sede
- e já se sentiam desfalecer.
-
6Mas, na sua angústia, clamaram ao SENHOR
- e Ele livrou-os das suas aflições.
-
7Conduziu-os depois por um caminho seguro,
- que levava a uma cidade onde podiam habitar.
-
8Dêem graças ao SENHOR, pelo seu amor
- e pelas suas maravilhas em favor dos homens.
-
9Pois Ele deu de beber aos que tinham sede,
- e matou a fome aos famintos.
-
10Alguns viviam nas trevas e na escuridão,
- prisioneiros da tristeza e de cadeias,
-
11por se terem revoltado contra as ordens de Deus
- e desprezado os decretos do Altíssimo.
-
12Abateu-lhes o coração com desventuras;
- tropeçavam e ninguém os socorria.
-
13Mas, na sua angústia, clamaram ao SENHOR,
- e Ele livrou-os das suas aflições.
-
14Tirou-os das trevas e da escuridão
- e despedaçou as suas cadeias.
-
15Dêem graças ao SENHOR, pelo seu amor
- e pelas suas maravilhas em favor dos homens.
-
16Ele fez em pedaços as portas de bronze
- e quebrou as barras de ferro!
-
17Enfraquecidos por causa dos seus pecados,
- aflitos por causa das suas culpas,
-
18qualquer alimento lhes causava náuseas
- e já estavam às portas da morte!
-
19Mas, na sua angústia, clamaram ao SENHOR,
- e Ele livrou-os das suas aflições.
-
20Deus enviou a sua palavra para os curar,
- e livrou-os da morte!
-
21Dêem graças ao SENHOR, pelo seu amor
- e pelas suas maravilhas em favor dos homens.
-
22Ofereçam sacrifícios de acção de graças
- e anunciem as suas obras com alegria.
-
23Os que se fizeram ao mar nos seus navios,
- para fazer comércio na imensidão das águas,
-
24esses viram as obras do SENHOR
- e as suas maravilhas no alto mar.
-
25À sua palavra, soprou um vento de tempestade
- e as ondas levantaram-se;
-
26elevavam-se até aos céus e desciam às profundezas;
- a sua vida desfalecia pelo enjoo.
-
27Andavam e cambaleavam como ébrios
- e toda a sua perícia se tornava inútil.
-
28Mas, na sua angústia, clamaram ao SENHOR,
- e Ele livrou-os das suas aflições.
-
29Transformou a tempestade em bonança,
- e as ondas do mar amainaram.
-
30Alegraram-se, ao verem as ondas acalmadas,
- e Deus conduziu-os ao porto desejado.
-
31Dêem graças ao SENHOR, pelo seu amor
- e pelas suas maravilhas em favor dos homens.
-
32Aclamem-no na assembleia do povo
- e louvem-no no conselho dos anciãos.
-
33O SENHOR converteu os rios em deserto,
- e as fontes de água em terra árida;
-
34converteu a terra fértil em salinas,
- por causa da maldade dos seus habitantes;
-
35mudou os desertos em lagos
- e a terra árida em mananciais,
-
36para ali estabelecer os famintos
- e eles construírem cidades de habitação.
-
37Semearam campos e plantaram vinhas,
- que produziram abundantes frutos.
-
38Abençoou-os e eles multiplicaram-se em grande número,
- e não deixou que os seus rebanhos diminuíssem.
-
39Depois, foram reduzidos e dizimados,
- por causa da opressão, do mal e do sofrimento.
-
40Mas Deus, que mostra desprezo pelos poderosos,
- fê-los vaguear por desertos sem caminhos.
-
41Levantou o pobre da miséria
- e multiplicou a sua família como um rebanho.
-
42Os justos, ao verem isto, alegram-se;
- mas os que são maus ficam em silêncio.
-
43Aquele que for sábio reflectirá em tudo isto
- e compreenderá o amor do SENHOR.
Capítulo 108
HINO E SÚPLICA (Sl 57,8-12; 60,7-14)
Este salmo colectivo de súplica vê o destino do povo ligado ao da cidade de Sião, onde assenta o santuário de Deus. Dali se afirma o domínio sobre as terras à volta. Os v.2-67 coincidem com o Sl 57,8-12; e os v.9-14 aparecem em Sl 60,7-14. Deus é chamado “Elohim” e não Javé, como nos salmos 57 e 60. Isso significa que esta versão deve ser mais tardia.
- 1Cântico. Salmo de David.
-
2Ó Deus, o meu coração está firme;
- quero cantar e salmodiar, ó minha glória!
-
3Despertai, harpa e cítara!
- Quero despertar a aurora!
-
4Hei-de louvar-te, SENHOR, entre os povos,
- hei-de cantar-te salmos entre as nações;
-
5pois o teu amor é mais alto que o céu
- e a tua fidelidade chega até às nuvens.
-
6Ó Deus, revela nas alturas a tua grandeza,
- e sobre a terra, a tua glória!
-
7Para que os teus amigos sejam libertados,
- salva-nos com a tua mão direita e responde-nos!
-
8Deus falou no seu santuário:
- «Com alegria dividirei Siquém
- e medirei o Vale de Sucot!
-
9É minha a terra de Guilead e a terra de Manassés.
- Efraim é o elmo da minha cabeça e Judá, o meu ceptro real.
-
10Moab é a bacia em que Eu me lavo,
- sobre Edom porei as minhas sandálias
- e cantarei vitória sobre a Filisteia.»
-
11Quem me conduzirá à cidade fortificada?
- Quem me guiará até Edom?
-
12Quem senão Tu, ó Deus, que nos rejeitaste
- e já não vais à frente dos nossos exércitos?
-
13Concede-nos ajuda na tribulação,
- porque é vão qualquer socorro humano.
-
14Com a ajuda de Deus, faremos proezas;
- Ele calcará aos pés os nossos inimigos.
Capítulo 109
PRECE CONTRA OS INIMIGOS
Este salmo individual de súplica toma como motivo acusações infundadas de pessoas que lhe pagam o bem com o mal (v.2-5). Os v.6-8 contêm a reacção quase primária contra os referidos ataques, invocando castigos contra os seus inimigos. Estes versículos são, ao mesmo tempo, exemplo de imprecações feitas em elevado estilo literário. Nos v.21-31 o salmista atinge a serenidade de uma oração que exprime a sua confiança em Deus.
- 1Ao director do coro. De David. Salmo.
-
Ó Deus, a quem eu louvo,
- não fiques em silêncio.
- 2Pois abriram a boca contra mim,
-
com fraudes e traições,
- e falaram de mim com linguagem mentirosa.
-
3Cercam-me com palavras de ódio,
- atacam-me sem razão.
-
4Em paga do meu amor, acusam-me;
- mas eu entrego-me à oração.
-
5Pagam-me o bem com o mal,
- o amor com o ódio.
-
6Eles dizem: «Suscita contra ele um homem mau
- e à sua direita esteja um acusador.
-
7Quando for julgado, saia condenado,
- e, na sua apelação, resulte incriminado.
-
8Sejam abreviados os seus dias
- e outro ocupe o seu lugar.
-
9Que os seus filhos fiquem órfãos
- e a sua mulher fique viúva!
-
10Que os seus filhos andem errantes a mendigar
- e sejam expulsos das suas casas em ruína.
-
11Que o credor lhe tire todos os seus haveres
- e os estranhos lhe arrebatem o fruto do seu trabalho.
-
12Que ninguém tenha compaixão dele,
- nem dos seus filhos órfãos.
-
13Que seja exterminada a sua descendência
- e seja apagado o seu nome numa geração.
- 14Que o SENHOR conserve na sua lembrança
-
a culpa de seus pais
- e jamais se apague o pecado de sua mãe.
-
15Que tais pecados estejam sempre presentes ao SENHOR
- e que Ele faça desaparecer da terra a sua memória.
-
16Pois esse homem nunca pensou em usar de misericórdia,
- mas perseguiu o pobre e o desvalido
- e empurrou para a morte o aflito de coração.
-
17Amou a maldição: que ela caia sobre ele!
- Desprezou a bênção: que ela o abandone!
-
18Revestiu-se da maldição como de um manto:
- que ela penetre nas suas entranhas como água
- e, como azeite, nos seus ossos;
-
19seja para ele como um vestido a envolvê-lo
- e a apertá-lo como uma cinta.»
-
20Que o SENHOR castigue assim os meus caluniadores
- e os que falam mal de mim.
- 21Mas Tu, SENHOR, meu Deus,
-
por amor do teu nome, ajuda-me.
- Salva-me, pela tua bondade e misericórdia!
-
22Porque estou pobre e aflito,
- e tenho o coração angustiado dentro de mim.
-
23Desfaleço como a sombra que declina;
- vejo-me enxotado como um gafanhoto.
-
24Os meus joelhos vacilam de tanto jejuar
- e o meu corpo definha de magreza.
-
25Tornei-me para eles objecto de desprezo;
- ao verem-me, abanam a cabeça.
-
26Socorre-me, SENHOR, meu Deus;
- salva-me, pela tua bondade.
-
27Para que saibam que és Tu o meu salvador,
- que foste Tu, SENHOR, que assim fizeste.
-
28Eles poderão amaldiçoar-me, mas Tu abençoas-me.
- Que os meus inimigos se cubram de confusão
- e que o teu servo se regozije.
-
29Que os meus inimigos se encham de vergonha;
- que a sua confusão os cubra como um manto.
-
30Agradecerei bem alto ao SENHOR
- e louvá-lo-ei no meio da multidão.
-
31Porque Ele é o defensor do pobre;
- salva-o dos que o querem condenar.
Capítulo 110
PROMESSAS DE DEUS AO SEU UNGIDO (2; 45; 89)
Salmo real. Sublinha bem as relações da realeza com a vida religiosa e cultual de Israel. O «meu senhor» (v.1) refere-se ao rei. Já é mais difícil de saber a época em que terá sido composto. Há quem pense que pode ser muito antigo, próximo da instalação da Arca da aliança em Jerusalém, no tempo de David. Segundo outros, algumas das ideias messiânicas que ligam realeza e sacerdócio poderiam indiciar a composição em época tardia. Este salmo foi muito utilizado nos primeiros tempos do cristianismo pelas suas ressonâncias messiânicas.
- 1De David. Salmo.
-
Disse o SENHOR ao meu senhor:
- «Senta-te à minha direita,
-
e Eu farei dos teus inimigos
- um estrado para os teus pés.»
-
2De Sião, o SENHOR estenderá o ceptro do teu poder.
- Dominarás os teus inimigos na batalha!
- 3A tua família é de nobres,
-
desde o dia em que nasceste;
- no esplendor do santuário,
- das entranhas da madrugada,
- como orvalho, Eu te gerei.
-
4O SENHOR jurou e não voltará atrás:
- «Tu és sacerdote para sempre,
- segundo a ordem de Melquisedec.»
-
5O Senhor está à tua direita;
- Ele esmagará os reis, no dia da sua ira;
-
6julgará as nações:
- amontoará cadáveres e esmagará cabeças
- pela vastidão da terra.
-
7No caminho, beberá da torrente;
- e, logo a seguir, erguerá a cabeça.