Capítulo 11
1Fez prosperar as suas obras pelas mãos de um santo profeta.
2Atravessaram um deserto desabitado
e montaram as suas tendas em lugares intransitáveis.
3Resistiram aos inimigos
e repeliram os seus adversários.
1.° Contraste: A sabedoria acompanha Israele castiga o Egipto (Ex 17,1-7; Nm 20,2-13; Dt 8,2-5)
4Tiveram sede e invocaram-te;
deste-lhes, então, água de uma rocha dura,
e numa dura pedra encontrou remédio a sua sede.
5Assim, isso mesmo que tinha servido de castigo aos seus inimigos
tornou-se para eles benefício nas suas provações.
6Em lugar da água corrente do rio
turvada de sangue e lama,
7em castigo pelo decreto infanticida,
deste-lhes, inesperadamente, água abundante,
8depois de lhes teres mostrado, pela sede que então sofreram,
como castigaste os inimigos.
9Quando, pois, foram provados,
embora corrigidos com amor,
compreenderam como deviam ter sofrido os ímpios,
julgados com ira,
10pois a eles os provaste como pai que corrige,
mas a estes os castigaste como rei severo que condena.
11Tanto quando estavam presentes como ausentes,
foram igualmente atormentados,
12pois uma dupla pena os atingiu,
gemendo com a lembrança dos males passados:
13quando compreenderam que o seu próprio castigo
era um bem para os outros, reconheceram que era o Senhor;
14pois aquele que outrora tinham rejeitado, expondo-o,
ao fim dos acontecimentos o admiraram,
quando sentiram uma sede diferente da dos justos.
Moderação do castigo divino para com os egípcios
15Por causa dos pensamentos estúpidos,
inspirados na sua maldade,
que os extraviaram ao ponto de prestar culto
a répteis irracionais e animais desprezíveis,
enviaste-lhes, como castigo, uma multidão de animais irracionais,
16para que compreendessem que,
conforme o pecado, assim é o castigo.
17Pois não teria sido difícil à tua mão poderosa,
que criara o mundo de matéria informe,
enviar contra eles uma multidão de ursos e leões ferozes
18ou animais de espécies novas, recém-criadas, ferocíssimos,
que exalassem um sopro de fogo,
que expelissem fumo intoxicante
ou lançassem dos olhos relâmpagos terríveis,
19capazes não só de os exterminarem com as suas mordeduras,
mas até de os fazerem morrer de terror, pelo seu aspecto repelente.
20Mas, mesmo sem isso, eles poderiam morrer com um sopro,
perseguidos pela justiça
e dispersos pelo teu sopro poderoso.
Tu, porém, regulaste tudo com medida, número e peso.
21O teu grande poder está sempre ao teu serviço;
quem poderá resistir à força do teu braço?
22Pois diante de ti, o mundo inteiro é como um grão de areia na balança,
como a gota de orvalho que de manhã cai sobre a terra.
23Mas Tu tens compaixão de todos, pois tudo podes
e desvias os olhos dos pecados dos homens, a fim de os levar à conversão.
24Tu amas tudo quanto existe
e não detestas nada do que fizeste;
pois, se odiasses alguma coisa, não a terias criado.
25E como subsistiria uma coisa, se Tu a não quisesses?
Ou como se conservaria, se não tivesse sido chamada por ti?
26Mas Tu poupas a todos, porque todos são teus,
ó Senhor, que amas a vida!
Capítulo 12
1O teu espírito incorruptível está em todas as coisas!
2Por isso, pouco a pouco corriges os que caem, os repreendes e lhes recordas o seu pecado, para que se afastem do mal e creiam em ti, Senhor.
Moderação do castigo divino para com os cananeus (Nm 33,51-56; Dt 20,16-18; Sl 78,39; 103,14)
3Os antigos habitantes da tua terra santa,
4Tu os odiaste por causa das obras detestáveis:
práticas de magia e ritos sacrílegos,
5cruéis mortes de crianças
e banquetes de carne e sangue humanos;
a esses iniciados em sangrentas orgias,
6a esses pais assassinos de vidas indefesas
decidiste exterminá-los por meio dos nossos antepassados,
7para que esta terra, a mais querida de todas para ti,
recebesse uma digna colónia de filhos de Deus.
8Mas também para com aqueles, porque não deixavam de ser homens,
foste clemente, mandando-lhes vespas,
como precursoras do teu exército,
para os exterminarem pouco a pouco.
9De facto, Tu podias ter entregue os ímpios
às mãos dos justos numa batalha,
ou destruí-los de uma só vez por meio de animais ferozes
ou com uma palavra penetrante;
10mas exercendo a tua justiça progressivamente,
lhes davas tempo para se arrependerem,
não ignorando embora que eram de má estirpe
e a sua maldade, congénita,
e que jamais mudaria a sua mentalidade.
11Pois era uma raça maldita desde a origem.
E, sem medo de quem quer que fosse, deixaste impunes os seus pecados.
12Quem ousará, pois, dizer: «Que fizeste?»
Ou quem se oporá à tua decisão?
Quem te repreenderá por teres destruído as nações que Tu próprio criaste?
Ou quem se levantará contra ti a fim de defender homens injustos?
13Não há fora de ti um Deus que cuide de tudo,
a quem tenhas de mostrar que os teus juízos não são injustos.
14Não há rei nem soberano que possa desafiar-te
para defender os que castigaste.
15Porque Tu és justo, governas tudo com justiça,
e julgas impróprio do teu poder
condenar a quem não merece castigo.
16Pois o teu poder é o princípio da justiça
e o teu domínio sobre tudo te torna indulgente para com todos.
17Demonstras a tua força a quem não crê no teu poder
e confundes a ousadia de quem a reconhece.
18Mas Tu, que dominas a tua força, julgas com bondade
e nos governas com grande indulgência,
pois podes usar o teu poder quando quiseres.
Lição de Deus aos israelitas
19Ao actuar assim, Tu ensinaste o teu povo
que o justo deve ser amigo dos homens,
e deste a teus filhos uma boa esperança,
porque, após o pecado, dás a conversão.
20Se aos inimigos de teus filhos, dignos de morte,
os castigaste com tanta benignidade e indulgência,
dando-lhes tempo e lugar para se afastarem do mal,
21com quanto mais cuidado não julgaste os teus filhos,
a cujos antepassados fizeste juramentos e alianças com boas promessas?
22Assim, para nos educar, castigas com moderação os nossos inimigos
para que, quando julgarmos, pensemos na tua bondade
e, ao sermos julgados, esperemos misericórdia.
Castigo progressivo dos egípcios
23Por isso, também àqueles que loucamente viveram no mal,
os fizeste sofrer pelas suas próprias abominações,
24pois se extraviaram demasiado nos caminhos do erro,
tomando por deuses os mais vis e repugnantes animais,
deixando-se enganar como crianças sem raciocínio.
25Por isso, como a meninos sem razão,
lhes deste um castigo que os pôs a ridículo.
26Mas os que com semelhante correcção não se emendaram,
sofrerão um castigo digno de Deus.
27Irritados pelo sofrimento causado por esses animais,
e vendo-se castigados por aqueles que tomavam por deuses,
reconheceram como Deus verdadeiro
aquele que outrora recusavam conhecer.
Por isso, caiu sobre eles a condenação final.
Capítulo 13
As criaturas conduzem a Deus (Act 14,17; 17,27; Rm 1,19-20)
1Sim, insensatos são todos aqueles homens
em que se instalou a ignorância de Deus
e que, a partir dos bens visíveis,
não foram capazes de descobrir aquele que é,
nem, considerando as obras, reconheceram o Artífice.
2Antes foi o fogo, o vento ou o ar subtil,
a abóbada estrelada, ou a água impetuosa,
ou os luzeiros do céu que tomaram por deuses, governadores do mundo.
3Se, fascinados pela sua beleza, os tomaram por deuses,
aprendam quão mais belo que tudo é o Senhor,
pois foi o próprio autor da beleza que os criou.
4E se os impressionou a sua força e o seu poder,
compreendam quão mais poderoso é aquele que os criou,
5pois na grandeza e na beleza das criaturas
se contempla, por analogia, o seu Criador.
6Estes, contudo, merecem só uma leve censura
porque talvez se extraviem, apenas
por buscarem Deus e quererem encontrá-lo.
7Movendo-se no meio das suas obras, investigam-nas,
mas deixam-se seduzir pela aparência,
pois são belas as coisas que vêem.
8De qualquer modo, nem sequer estes são desculpáveis,
9porque, se tiveram tanta capacidade
para poderem perscrutar o universo,
como não descobriram, primeiro, o Senhor dessas coisas?
Os ídolos são coisas vãs (15,7-13; Sl 135,15-17; Is 40,18-20; Br 6,4-72)
10Mas mais infelizes são aqueles
que puseram a sua esperança em coisas mortas,
os que chamaram deuses à obra de mãos humanas:
ouro e prata trabalhados com arte,
figuras de animais ou alguma pedra inútil, obra de mão antiga.
11Imaginemos um carpinteiro: corta com uma serra um tronco fácil de trabalhar,
tira-lhe cuidadosamente toda a casca,
trabalha-o habilmente
e faz dele um utensílio para uso comum.
12Com o que sobrou da sua obra,
prepara a comida com que fica saciado.
13O último desperdício que não serve para nada,
um pau torto e cheio de nós,
ele toma-o e, nas horas de lazer, trabalha-o,
modela-o com arte para distrair-se
e dá-lhe as feições de um homem,
14ou a figura de um animal desprezível;
depois cobre-o de vermelho, pinta-o de cor encarnada
e faz desaparecer todos os seus defeitos.
15Enfim, prepara-lhe um nicho adequado,
coloca-o na parede e fixa-o com um prego;
16toma precauções para que não caia,
sabendo que ele não pode valer-se a si mesmo,
pois é uma estátua que precisa de ajuda.
17Não se envergonha de falar com aquele objecto sem vida;
mas, quando lhe reza pelos seus bens, pelo seu casamento e pelos filhos,
pede saúde a quem é fraco,
18pede vida a quem está morto;
pede ajuda a quem não pode socorrer,
pede uma viagem feliz a quem nem sequer pode dar um passo;
19e, para os investimentos, negócios e trabalhos,
pede força a quem nem é capaz de mexer as mãos.
Capítulo 14
1Há também quem, querendo navegar e atravessar as ondas encrespadas,
invoque a um madeiro mais frágil que o barco que o transporta.
2Foi, com efeito, a ambição do lucro que o inventou
e um artista que, com sabedoria, o fabricou.
3Mas é a tua providência, ó Pai, quem segura o leme,
pois abriste um caminho até no mar,
e uma rota segura no meio das ondas,
4mostrando assim que podes salvar de todo o perigo,
de tal modo que, mesmo sem experiência, alguém pode embarcar.
5Tu não queres que as obras da tua sabedoria sejam inúteis.
Por isso, os homens confiam as suas vidas a uma pequena barca,
e, atravessando as ondas, salvam-se numa jangada.
6Já no princípio, quando pereciam os gigantes orgulhosos,
a esperança do mundo se refugiou numa barca
que, pilotada pela tua mão, legou ao mundo a semente de uma nova geração.
7Bendito seja, pois, o madeiro pelo qual vem a justiça!
8 Mas maldito seja o ídolo, obra da mão humana,
tanto ele, como quem o fez:
este porque o fez, aquele porque, sendo corruptível, foi chamado deus.
9Pois Deus odeia igualmente o ímpio e a sua maldade;
10e a obra e o seu autor receberão igual castigo.
11Por isso, serão julgados os ídolos das nações
porque, na criação de Deus, se converteram em algo abominável,
escândalo para as almas dos homens
e armadilha para os pés dos insensatos.
Origem da idolatria
12A ideia de fazer ídolos originou esta prostituição,
a sua descoberta corrompeu a vida.
13Pois eles não existiam ao princípio nem existirão para sempre.
14Foi pela insensatez dos homens que entraram no mundo.
Por isso, foi decretado o seu fim para breve.
15Afligido por um luto prematuro, um pai
manda fazer a imagem do filho, tão cedo arrebatado,
e honra agora como deus o que antes era um homem morto,
instituindo para os seus subordinados ritos e mistérios.
16Com o tempo, firma-se o ímpio costume
que passa a ser observado como lei.
17Também por ordem dos soberanos, as estátuas recebem culto.
Aqueles que, por viverem longe, não os podiam honrar pessoalmente,
representavam a sua figura distante,
fazendo uma imagem visível do rei que honravam,
para adular com fervor o ausente, como se estivesse presente.
18Para a extensão do culto, mesmo entre aqueles que o não conheciam,
contribuiu a ambição do artista,
19pois, querendo este talvez agradar ao soberano,
esmerou a sua arte para o fazer mais belo que a realidade.
20Assim, a gente, atraída pelo encanto da obra,
adorava ao que pouco antes honrava como homem.
21E isto se converteu numa cilada para a humanidade,
pois os homens, vítimas da desgraça ou do poder,
deram o nome incomunicável à pedra e à madeira.
Consequências da idolatria (Rm 1,24-32)
22Como se não bastasse terem errado acerca do conhecimento de Deus,
eis que, debatendo-se na sua própria ignorância,
os homens, vivendo em violenta guerra,
chamam paz a tão grandes males.
23Pois, com os seus ritos infanticidas, os seus mistérios ocultos,
ou as suas frenéticas orgias de ritos extravagantes,
24já não guardam pura nem a vida nem o casamento,
mas um ao outro se mata à traição
ou se ultrajam pelo adultério.
25Por toda a parte andam misturados
sangue e crime, roubo e fraude,
corrupção, deslealdade, revolta e perjúrio,
26confusão dos valores, esquecimento da gratidão,
impureza das almas, perversão sexual,
desordem dos casamentos, adultério e imoralidade.
27Pois o culto dos ídolos impessoais
é o princípio, a causa e o fim de todos os males.
28Na verdade, ou se entregam a divertimentos até ao delírio,
ou profetizam a mentira,
ou vivem na injustiça, ou perjuram a toda a hora.
29Ao pôr a sua confiança em ídolos sem vida,
não temem dano algum pelos seus falsos juramentos.
30Um duplo castigo, porém, cairá sobre eles,
porque se equivocaram acerca de Deus, adorando os ídolos,
e juraram contra a verdade e a justiça, desprezando a santidade.
31Pois não é o poder dos ídolos invocados,
mas a justiça que se exerce sobre os pecadores
que persegue sempre as faltas dos injustos.
Capítulo 15
A fé preserva Israel da idolatria
1Mas Tu, nosso Deus, és bom e verdadeiro,
paciente, e tudo governas com misericórdia.
2Mesmo quando pecamos, somos teus; pois conhecemos o teu poder,
mas não queremos pecar, sabendo que te pertencemos.
3Conhecer-te leva à justiça perfeita,
e reconhecer o teu poder é a raiz da imortalidade.
4Não nos extraviaram as perversas invenções dos homens,
nem as estéreis obras dos pintores,
figuras besuntadas de várias cores,
5cuja contemplação desperta a paixão dos insensatos,
que se entusiasmam com a figura inanimada de uma imagem morta.
6Enamorados do mal e dignos de tais esperanças
assim são os que as fazem, as amam ou as adoram!
Insensatez dos fabricantes de ídolos (13,10-19)
7Olhai o oleiro que amassa intensamente a terra mole
e modela cada objecto para o nosso uso.
Da mesma argila, modela
tanto os vasos para serviços limpos
como os destinados para usos contrários;
mas é o oleiro quem determina
qual deve ser o uso de cada um deles.
8Depois – esforço mal empregado –
modela um falso deus do mesmo barro,
ele que pouco antes saíra da terra
e, pouco depois, voltará a essa terra, de onde foi tirado,
quando tiver que prestar contas da vida recebida.
9Mas não pensa que tem de morrer
nem que a sua vida é breve;
antes, rivaliza com fabricantes de ouro e prata,
imita os que trabalham o bronze
e vangloria-se de fabricar figuras falsas.
10É cinza o seu coração, mais vil que a terra é a sua esperança,
a sua vida é mais desprezível do que o barro,
11porque desconhece aquele que o formou,
aquele que lhe infundiu uma alma activa
e lhe insuflou o espírito vital.
12Considera a nossa vida como um divertimento
e a existência como uma feira de negócios,
pois – diz ele – é preciso tirar proveito de tudo, até mesmo do mal.
13Mas, melhor que ninguém, ele bem sabe que peca,
fazendo do mesmo barro vasos frágeis e estátuas de ídolos.
Os egípcios, os idólatras mais insensatos (Sl 115,4-8; 135,15-18)
14Muito mais insensatos e infelizes que a alma duma criança
são os inimigos do teu povo, que o oprimiam;
15pois eles consideraram como deuses todos os ídolos das nações,
que não podem servir-se dos olhos para ver,
nem do nariz para respirar o ar,
nem dos ouvidos para ouvir,
nem dos dedos das mãos para apalpar,
e cujos pés são inúteis para andar.
16Pois foi um homem quem os fez,
o espírito de um ser emprestado os formou.
Ora nenhum homem pode fazer um deus semelhante a si.
17Como ele é mortal, as suas mãos ímpias só produzem coisas mortas.
É que ele é bem melhor que os objectos que adora,
pois ele foi dotado de vida e aqueles nunca a tiveram.
18E eles adoram, até, os mais repugnantes animais,
que, em estupidez, superam todos os outros.
19Nada há neles que os torne atraentes como os outros animais;
até foram excluídos do elogio de Deus e da sua bênção.
Capítulo 16
2.° Contraste: Codornizes para Israel e rãs para os egípcios (12,23.27; Ex 16,9-13; Nm 11,10-15.31-33)
1Por isso, foram justamente castigados por animais semelhantes,
torturados por pragas de bichos.
2Em vez de tal castigo, foste bom para o teu povo
e, para satisfazer o ardor do seu apetite,
preparaste-lhe codornizes, alimento delicioso.
3Assim, enquanto aqueles tinham fome,
mas perdiam o apetite perante o aspecto dos animais
enviados ao seu encontro,
estes, depois de um breve jejum,
saborearam um manjar delicioso.
4Era preciso, pois, que sobre aqueles opressores caísse uma fome implacável,
enquanto, a estes, bastava mostrar-lhes como eram atormentados os seus inimigos.
3.° Contraste: A serpente de bronze e os gafanhotos (Ex 8,16-20; 10,4-15; Nm 21,4-9)
5E mesmo, quando veio sobre eles a terrível fúria das feras,
e pereciam pela mordedura das serpentes sinuosas,
a tua ira não durou até ao fim.
6Para sua correcção, foram atribulados por pouco tempo,
mas tinham um sinal de salvação
para lhes recordar os mandamentos da tua Lei.
7Quem se voltava para ele era curado,
não pelo que via, mas por ti, salvador de todos.
8E assim demonstraste aos nossos inimigos
que és Tu quem livra de todo o mal.
9Eles morreram pelas picadas de gafanhotos e moscas,
sem poder encontrar remédio para salvar a vida
porque mereciam semelhante castigo.
10Mas, quanto aos teus filhos,
nem sequer os dentes das serpentes venenosas os puderam vencer,
porque interveio a tua misericórdia e os salvou.
11Eram picados e logo ficavam curados,
para que se lembrassem das tuas palavras,
a fim de não as esquecerem completamente,
e serem, assim, excluídos da tua benevolência.
12E nem erva nem pomada lhes serviu de alívio,
mas foi a tua palavra, Senhor, que tudo cura!
13Tu tens poder sobre a vida e a morte,
fazes descer até às portas do Abismo e de lá fazes regressar.
14É que o homem, pela sua maldade, pode matar;
mas não pode fazer regressar o espírito que tinha saído
nem pode libertar a alma que desceu ao Abismo.
4.° Contraste: Granizo e fogo para os egípcios e maná para os israelitas (Ex 9,24-25; 16; Sl 78,47-49)
15É impossível escapar à tua mão.
16Os ímpios que recusavam reconhecer-te
foram flagelados pelo poder do teu braço.
Caíram sobre eles chuvas estranhas, granizos,
tempestades implacáveis, e um fogo que os devorava.
17O mais surpreendente era que, na água que tudo apaga,
o fogo ainda mais ardia;
é que o universo combate pelos justos!
18Umas vezes, a chama abrandava,
para não queimar os animais enviados contra os ímpios,
a fim de que, ao contemplá-los,
reconhecessem que o juízo de Deus os perseguia.
19Outras vezes, mesmo no seio da água,
ela ardia com violência superior à do fogo,
para destruir os frutos de uma terra iníqua.
20Mas, pelo contrário, deste ao teu povo um alimento dos anjos,
enviaste-lhe do céu um pão, sem esforço deles,
capaz de todos os sabores e adaptado a todos os gostos.
21Este alimento manifestava a tua doçura para com os teus filhos,
já que se acomodava ao gosto de quem o comia
e se transformava segundo o desejo de cada um.
22A neve e o gelo resistiam ao fogo sem se derreterem,
para que soubessem que as colheitas dos inimigos
tinham sido destruídas por um fogo que ardia no meio do granizo
e flamejava sob a chuva;
23mas o mesmo fogo, em outra ocasião,
e para que os justos se alimentassem,
esqueceu-se até da sua própria força.
24É que a própria criação, submissa a ti, seu Criador,
se endurece para castigar os maus
e cede para fazer o bem aos que confiaram em ti.
25E assim, prestando-se a tomar todas as formas,
se colocava ao serviço da tua bondade, que a todos alimenta,
de acordo com o desejo dos que te suplicavam.
26Assim, os teus filhos queridos, Senhor, aprenderão
que não são os frutos que alimentam o homem,
mas é a tua palavra que alimenta os que crêem em ti.
27Pois, o que o fogo não destruía,
logo se derretia ao calor de um leve raio de Sol,
28para que todos soubessem que é necessário madrugar mais que o Sol,
a fim de te dar graças
e de te encontrar desde o raiar do dia.
29Mas a esperança do ingrato há-de derreter-se como a geada no Inverno,
há-de escoar-se como água que não presta.
Capítulo 17
5.° Contraste: Trevas para os egípcios e coluna de fogo para Israel (Ex 10,21-23; 13,21-22)
1Grandes e impenetráveis são os teus juízos.
Por isso, as almas ignorantes se extraviam.
2Os ímpios, pensando que podiam oprimir o teu povo santo,
ficaram prisioneiros das trevas e encarcerados numa longa noite,
encerrados sob os seus tectos e excluídos da eterna providência.
3Pensavam ficar ocultos com os seus pecados secretos,
sob o sombrio véu do esquecimento,
mas foram dispersos, possuídos de terrível espanto,
e apavorados por fantasmas.
4Nem o esconderijo em que se refugiavam os preservava do medo;
ruídos aterradores ressoavam à sua volta
e lúgubres espectros de pálidos rostos lhes apareciam.
5Nenhuma chama tinha força bastante para os alumiar,
nem os fulgores cintilantes dos astros
conseguiam iluminar aquela horrorosa noite.
6Somente brilhava para eles
um clarão aceso por si mesmo e que os apavorava;
mas, logo que desaparecia a visão, ficavam aterrados
e consideravam ainda pior o que viam.
7Os artifícios da magia mostravam a sua impotência,
e a sua pretensão de inteligência conhecia um fracasso humilhante,
8pois os que prometiam afugentar os medos
e as perturbações da alma doente,
esses mesmos eram vítimas de um pânico ridículo.
9Mesmo que nada de mais grave os perturbasse,
a passagem de animais e os sibilos das serpentes os sobressaltavam
e morriam de medo,
recusando-se até a olhar à sua volta, o que não se pode evitar.
10Com efeito, a maldade é cobarde e por seu próprio testemunho se condena;
pressionada pela consciência, sempre imagina o pior,
11porque o medo não é outra coisa
senão a renúncia aos auxílios da razão.
12Quanto menor é a segurança interior
tanto mais se sente a ignorância da causa do tormento.
13Eles, porém, durante aquela noite verdadeiramente insuportável,
saída das profundezas do impotente Abismo,
dormiam o mesmo sono:
14eram perturbados por espectros monstruosos,
pelo abatimento da alma,
pois um súbito e inesperado terror os invadira.
15E também todo aquele, fosse quem fosse, que lá estivesse caía,
ficava preso e encarcerado e numa prisão sem trancas.
16De facto, se o agricultor ou o pastor,
ou o trabalhador do campo
fosse surpreendido pelo flagelo,
deveria suportar a necessidade inelutável,
pois todos estavam acorrentados à mesma cadeia de trevas.
17O vento que assobiava,
o canto melodioso dos pássaros na ramagem frondosa,
o murmúrio das águas correndo impetuosas
ou o estrondo das rochas que se desprendiam,
18a carreira invisível de animais saltitantes,
o forte rugido dos animais mais selvagens
ou o eco que se repercutia nos vales das montanhas,
tudo os fazia estarrecer de pavor.
19Pois o mundo inteiro estava iluminado por uma luz esplendorosa
e cada um prosseguia, sem obstáculos, os seus trabalhos.
20Somente sobre eles se tinha estendido uma densa noite,
imagem das trevas que os esperavam.
Mas, para si mesmos, eles eram mais insuportáveis do que as trevas.
Capítulo 18
1Para os teus santos, pelo contrário, havia uma luz brilhantíssima.
Os outros, que ouviam a sua voz mas não viam a sua figura,
felicitavam-nos por não terem sofrido como eles,
2agradeciam-lhes por não se terem vingado dos maus tratos recebidos
e pediam-lhes perdão pela sua hostilidade.
3Ora, em lugar de trevas, deste aos teus uma coluna de fogo
para os guiar por um caminho desconhecido,
como sol inofensivo, na sua gloriosa peregrinação.
4Mas os outros bem mereciam ser privados de luz e encerrados em trevas,
por terem mantido presos os teus filhos,
pelos quais se devia comunicar ao mundo a luz incorruptível da tua Lei.
6.° Contraste: Noite de morte para os egípcios e de libertação para os israelitas
(Ex 1,22-2,10; 12,29-30; 14,26-28; Ap 19,11-15)
5Àqueles que tinham decidido matar os filhos dos santos,
um dos quais foi exposto e salvo,
para os castigar, Tu lhes tiraste uma multidão de filhos
e os aniquilaste todos juntos na água impetuosa.
6Aquela noite fora de antemão conhecida por nossos pais,
para que, sabendo em que promessas tinham acreditado,
se sentissem encorajados.
7Assim, era esperada pelo teu povo
a salvação dos justos e a ruína dos inimigos.
8Com efeito, o que foi um castigo para os nossos adversários,
tornou-se para nós um título de glória,
pois nos chamavas para ti.
9Os piedosos, filhos dos justos, ofereciam sacrifícios secretos
e, de comum acordo, estabeleceram esta lei divina
de que os santos partilhassem
igualmente seus bens e perigos.
E logo entoaram os hinos dos pais.
10Em contrapartida, ressoavam
os gritos dissonantes dos inimigos,
e ecoava a voz plangente dos que choravam os seus filhos.
11A mesma dor feria escravo e senhor,
e tanto sofria o plebeu como o rei.
12Todos igualmente, com o mesmo género de morte,
tinham inumeráveis mortos;
não havia vivos suficientes para os enterrar,
pois, num instante, perecera o melhor da sua raça.
13Então, aqueles que tinham permanecido incrédulos por causa da magia,
ao ver morrer os seus primogénitos,
reconheceram que este povo era filho de Deus.
14Quando um silêncio profundo envolvia todas as coisas
e a noite ia a meio do seu curso,
15então, a tua palavra omnipotente desceu do céu e do trono real
e, como um implacável guerreiro,
lançou-se para o meio da terra condenada à ruína,
trazendo, como espada afiada, o teu irrevogável decreto.
16Deteve-se e encheu de morte o universo;
de um lado, tocava o céu, do outro, pisava a terra.
17Logo sonhos e visões terríveis os perturbaram
e os assaltaram temores inesperados.
18Caídos meio-mortos por toda a parte,
manifestavam a causa da sua morte,
19pois os sonhos que os agitavam lhes tinham revelado tal causa,
a fim de que não morressem sem saber porque eram castigados.
Intervenção de Aarão (Nm 17,6-15; 1 Cor 10,8)
20No entanto, a provação da morte também feriu os justos,
e um flagelo abateu grande número no deserto,
mas a ira não durou muito,
21pois um homem irrepreensível se apressou a tomar a defesa deles:
com as armas do seu ministério,
a oração e o incenso expiatório
enfrentou a ira e pôs fim ao flagelo,
mostrando bem que era teu servo.
22Venceu a revolta, não pela força corporal,
nem pela força das armas,
mas, pela palavra, deteve quem os castigava,
recordando as promessas e as alianças feitas aos patriarcas.
23Já os mortos se amontoavam uns sobre os outros,
quando ele se interpôs, detendo o assalto
e cortando-lhe o caminho que levava aos vivos.
24Na sua longa veste, estava representado o universo inteiro,
em quatro fileiras de pedras preciosas
estavam gravados os nomes gloriosos dos patriarcas,
e a tua majestade, sobre o diadema da sua cabeça.
25Perante estas coisas, o exterminador recuou assustado;
e a simples demonstração da tua ira fora suficiente.
Capítulo 19
7.° Contraste: O Mar Vermelho, morte para os egípcios e libertação para os israelitas (Ex 14,5-22; 15)
1Então sobre os ímpios descarregou até ao fim uma ira implacável,
pois Deus sabia de antemão o seu comportamento:
2sabia que eles os deixariam partir,
que os despediriam apressadamente,
mas que mudariam de ideias e os perseguiriam.
3De facto, tendo ainda em suas mãos os objectos do luto
e chorando sobre os túmulos dos mortos,
eis que concebem outro plano descabido:
aos que tinham pedido que saíssem,
perseguem agora como se de fugitivos se tratasse.
4Um merecido destino os arrastou a este extremo
e os fez esquecer o passado,
para que sofressem o castigo que faltava aos seus tormentos;
5e, enquanto o teu povo realizava uma travessia prodigiosa,
eles encontraram uma morte insólita.
6É que toda a criação, obediente às tuas ordens,
tomava novas formas em sua própria natureza
para guardar os teus filhos de todo o mal.
7Uma nuvem cobriu de sombra o acampamento
e do que dantes era água viu-se emergir terra seca,
o Mar Vermelho tornou-se um caminho transitável,
e as ondas impetuosas, uma planície verdejante;
8por ali passou todo o povo, protegido pela tua mão,
contemplando prodígios admiráveis.
9Iam como cavalos pastando no prado,
e como cordeiros saltitando,
e glorificavam-te, Senhor, a ti que os salvavas.
10Pois se recordavam ainda dos acontecimentos do exílio:
como a terra, em vez de animais, produziu mosquitos,
e como o rio, em vez de peixes,
lançou para fora uma multidão de rãs.
11Mais tarde, também viram uma nova espécie de aves,
quando, movidos pelo apetite, pediram manjares apetitosos,
12e, para satisfazerem os seus desejos,
vieram do lado do mar as codornizes.
Os egípcios, mais culpados que os habitantes de Sodoma (Ex 1,8-14; 5,4-18)
13Os castigos caíram sobre os pecadores,
não sem ter havido como sinais raios violentos.
Eles sofriam justamente pelas suas próprias maldades,
pois tinham mostrado violenta aversão aos estrangeiros.
14Outros houve que não quiseram acolher os desconhecidos que chegavam.
Mas eles escravizaram hóspedes que tinham sido seus benfeitores.
15Mas não é tudo: para aqueles haverá um castigo,
pois receberam os estrangeiros de modo hostil;
16mas estes, depois de terem recebido com alegria
aqueles que já tinham parte nos mesmos direitos,
maltrataram-nos com terríveis trabalhos.
17Por isso, foram feridos de cegueira
como aqueles que, às portas do justo,
envoltos em densas trevas,
procurava cada um a entrada de sua própria casa.
Uma nova harmonia
18Assim, os elementos mudavam entre si as suas propriedades
como na harpa, em que as notas modificam a natureza do ritmo,
mas conservam a mesma sonoridade.
É isto o que se pode ver claramente,
quando se examinam os acontecimentos:
19os animais terrestres mudavam-se em aquáticos,
e os aquáticos passavam para a terra;
20o fogo redobrava a sua força na água
e a água esquecia a sua propriedade de o extinguir;
21ao contrário, as chamas não consumiam as carnes dos débeis animais,
que iam e vinham por entre elas,
nem dissolviam aqueles deliciosos manjares, semelhantes ao gelo que facilmente derrete.
Doxologia final
22Em tudo, Senhor, Tu engrandeceste e glorificaste o teu povo,
e não deixaste de o assistir em todo o tempo e lugar.