Capítulo 1

Exortação a praticar a jus­tiça (Pr 8,31; Jo 8,34; 1 Cor 10,10)

1Amai a justiça, vós que gover­nais a terra,

tende para com o Senhor senti­mentos rectos

e buscai-o com sinceridade de co­ração.

2Porque Ele deixa-se encontrar por aqueles que não o tentam

e revela-se aos que não perdem a fé nele.

3Com efeito, os pensamentos per­versos afastam de Deus;

e o seu poder, posto à prova, con­funde os insensatos.

4A sabedoria não entrará numa alma maligna

nem habitará num homem sujei­to ao pecado.

5O espírito santo, que nos edu­ca, foge da duplicidade,

afasta-se dos pensamentos insen­sa­tos,

retira-se ao aproximar-se a ini­qui­dade.

6A sabedoria é um espírito bene­volente,

mas que não deixará sem castigo os lábios blasfemos,

porque Deus é testemunha dos seus pensamentos,

examina o seu coração segundo a verdade

e escuta as suas palavras.

7O espírito do Senhor enche o uni­verso,

e Ele, que tudo abrange, tem co­­nhecimento de quanto se diz.

8Aquele que profere palavras iní­quas, não poderá ocultar-se,

e a justiça acusadora não pas­sará ao largo dele:

9os planos do ímpio serão exami­nados,

o som das suas palavras chegará aos ouvidos do Senhor,

como prova dos seus delitos.

10Com efeito, é um ouvido cioso que tudo ouve,

até o ruído das murmurações não ficará escondido.

11Abstende-vos, pois, de mur­mu­­ra­ções inúteis;

evitai que a vossa língua se en­tre­­gue à maledicência,

porque a palavra secreta não fica sem efeito,

e a boca que calunia dá morte à alma.


A morte não vem de Deus, mas do pecado(2,23-24; Pr 8,36)

12Não procureis a morte com uma vida desregrada

nem susciteis a vossa perdição com as obras das vossas mãos.

13Deus não é o autor da morte

nem se compraz com a destrui­ção dos vivos.

14Pois Ele tudo criou para a exis­tência,

e todas as criaturas têm em si a salvação.

Não há nelas veneno de morte,

nem o poder do Hades domina so­­bre a terra,

15porque a justiça é imortal.


Existência segundo os ímpios

16Mas os ímpios atraem o Hades com palavras e obras;

julgando-o seu amigo, por ele se consomem,

fazem aliança com ele;

bem merecem fazer parte dele.

Capítulo 2

1Dizem, com efeito, nos seus fal­sos raciocínios:

«Breve e triste é a nossa vida,

não há remédio algum quando che­ga a morte.

E também não se conhece nin­guém

que tenha regressado do mundo dos mortos.

2Foi por acaso que viemos à exis­tência

e, depois, será como se não tivés­semos existido!

A respiração das nossas narinas é apenas fumo,

e o pensamento, uma centelha do bater do coração!

3Quando ela se apaga, o nosso corpo voltará ao pó,

e o nosso espírito se dissolverá como o ar subtil.

4Com o tempo, o nosso nome cai­rá no esquecimento,

e ninguém se lembrará das nos­sas obras.

A nossa vida é como uma nuvem que passa sem deixar rasto,

há-de dissipar-se como bruma,

ferida pelos raios de sol

e abatida pelo seu calor.

5O tempo da nossa vida é como sombra que passa,

e o nosso fim não se pode adiar,

pois a vida está selada e nin­guém pode voltar atrás.

6Vinde, pois! Gozemos dos bens pre­­­sentes,

tiremos prazer das criaturas com o ardor da nossa juventude!

7Inebriemo-nos do melhor vinho e de perfumes,

e não deixemos passar as pri­mei­ras flores da Primavera!

8Coroemo-nos de botões de rosas, antes que murchem!

9Nenhum de nós falte às nossas orgias;

deixemos em toda a parte sinais da nossa alegria,

pois esta é a nossa parte e a nossa herança.»


Atitude dos ímpios para com o justo (Jr 20,10-13)

10«Oprimamos o justo na sua po­breza,

não poupemos a viúva

nem respeitemos os cabelos bran­cos do ancião!

11Seja a nossa força a norma da jus­tiça

porque o que é fraco para nada serve.

12Armemos laços ao justo por­que nos incomoda,

e se opõe à nossa forma de actuar.

Censura-nos as transgressões da Lei,

acusa-nos de sermos infiéis à nossa educação.

13Ele afirma ter o conhecimento de Deus

e chama-se a si mesmo filho do Senhor!

14Ele tornou-se uma viva censura para os nossos pensamentos;

só o acto de o vermos nos inco­moda,

15pois a sua vida não é seme­lhan­te à dos outros,

e os seus caminhos são muito di­ferentes.

16Ele considera-nos como escória

e afasta-se dos nossos caminhos como de imundícies.

Declara feliz a sorte final do justo

e gloria-se de ter a Deus por pai.

17Vejamos, pois, se as suas pala­vras são verdadeiras,

e que lhe acontecerá no fim da vida.

18Porque, se o justo é filho de Deus,

Deus há-de ampará-lo e tirá-lo das mãos dos seus adversá­rios.

19Provemo-lo com ultrajes e tor­tu­ras

para avaliar da sua paciência

e comprovar a sua resistência.

20Condenemo-lo a uma morte in­fame,

pois, segundo ele diz, Deus o pro­tegerá.»


Os critérios er­ra­dos dos ímpios

21Estes são os seus pensamentos, mas enganam-se

porque os cega a sua malícia.

22Ignoram os desígnios secretos de Deus,

não esperam a recompensa da pie­dade

e não acreditam no prémio reser­vado às almas simples.

23Com efeito, Deus criou o ho­mem para a incorruptibilidade

e fê-lo à imagem do seu próprio ser.

24Por inveja do diabo é que a mor­te entrou no mundo,

e hão-de prová-la os que perten­cem ao diabo.

Capítulo 3

Prémio para os justos, cas­tigo para os ímpios

1As almas dos justos estão nas mãos de Deus

e nenhum tormento os atingirá.

2Aos olhos dos insensatos parece­ram morrer,

a sua saída deste mundo foi tida como uma desgraça,

3a sua morte, como uma derrota.

Mas eles estão em paz.

4Se aos olhos dos homens foram castigados,

a sua esperança estava cheia de imortalidade.

5Depois de terem sofrido um pouco,

receberão grandes bens,

pois Deus os provou e achou di­g­nos de si.

6Ele os provou como ouro no cri­sol

e aceitou-os como um holocausto.

7No tempo da intervenção de Deus, os justos resplan­dece­rão

e propagar-se-ão como centelhas através da palha.

8Julgarão as nações e dominarão os povos,

e o Senhor reinará sobre eles para sempre.

9Aqueles que nele confiam com­preen­derão a verdade,

e os que são fiéis no amor habi­tarão com Ele,

pois a graça e a misericórdia são para os seus eleitos.

10Os ímpios, pelo contrário,

serão castigados segundo os seus pensamentos,

porque desprezaram o justo e se afastaram do Senhor.

11Desgraçados daqueles que des­pre­­zam a sabedoria e a sua disci­plina!

Vã é a sua esperança, sem pro­veito os seus esforços,

inúteis as suas obras.

12As suas mulheres são insensa­tas,

e os filhos, depravados,

maldita, a sua descendência.


Esterilidade virtuosa e fecundi­dade com pecado (Sl 16,5-6; 37, 12-13; Is 56,3-5)

13Feliz a estéril imaculada,

que não manchou o seu leito:

terá a sua recompensa no dia do juízo.

14Feliz também o eunuco que não praticou o mal

nem teve maus pensamentos con­tra o Senhor:

receberá uma graça especial pela sua fidelidade

e um posto muito honroso no templo do Senhor.

15Pois é glorioso o fruto dos bons trabalhos

e imperecível a raiz da prudên­cia.

16Porém, os filhos dos adúlteros

não hão-de desabrochar,

e a descendência da união ilegí­tima será exterminada.

17Ainda que tenham vida longa, nin­guém fará caso deles,

e será sem honra o fim da sua ve­lhice.

18E se morrerem cedo, não terão es­perança

nem consolação no dia do juízo,

19pois é penoso o fim de uma raça injusta.

Capítulo 4

1Mais vale uma vida sem fi­lhos, possuindo a virtude,

pois a imortalidade está na recor­dação da virtude:

ela é reconhecida por Deus e pelos homens.

2Quando está presente, é imi­tada;

quando está ausente, é desejada;

na eternidade, triunfa e é coroada

por ter vencido, sem mancha, nos combates.

3Ao contrário, a numerosa poste­ri­dade dos ímpios será inútil:

saída de rebentos bastardos, não lançará raízes fundas

nem terá bases sólidas.

4Ainda que, por algum tempo, se cubra de ramos,

por não estar bem sólida, será aba­­lada pelo vento

e arrancada pela violência da tem­pestade.

5Os ramos serão quebrados ainda tenros,

os seus frutos serão inúteis,

verdes demais para serem comi­dos

e impróprios para qualquer uso.

6Pois os filhos das uniões ilícitas são testemunhas

da maldade de seus pais no dia do juízo.


Morte prematura do justo e lon­ga vida do ímpio

7O justo, porém, ainda que mor­ra prematuramente,

gozará de repouso.

8Uma velhice venerável não con­siste em longa vida

nem se mede pelo número de anos.

9As cãs do homem são a pru­dên­cia,

e uma verdadeira velhice é uma vida imaculada.

10Tendo-se tornado agradável a Deus, foi amado por Ele

e, como vivia entre os pecadores, foi transferido por Deus.

11Foi arrebatado a fim de que a malícia não lhe corrompesse a inte­ligência,

nem a astúcia lhe corrompesse a alma.

12Pois o fascínio do mal obscurece o bem,

e a vertigem da paixão perverte uma mente sem maldade.

13Chegado rapidamente à perfei­ção,

atingiu a plenitude de uma longa vida.

14A sua vida era agradável ao Se­nhor,

por isso Ele se apressou em tirá-lo do meio do mal.

As pessoas viram mas não com­preenderam

nem reflectiram nisto:

15que a graça e a misericórdia são para os seus eleitos

e que Ele intervirá em favor dos seus santos.

16O justo que morre condena os ímpios que sobrevivem;

e o jovem, que em pouco tempo chega à perfeição,

condena a longa vida do pecador.

17Eles verão o fim do sábio,

mas não compreenderão os desí­g­nios do Senhor sobre ele,

nem por que motivo o Senhor o pôs em segurança.

18Hão-de vê-lo e desprezá-lo,

mas o Senhor se rirá deles.

19Depois disto, se converterão num cadáver sem honra,

num objecto de opróbrio

para sempre entre os mortos;

pois o Senhor os precipitará de ca­beça para baixo,

sem poderem falar,

os sacudirá nos seus funda­men­tos,

e ficarão totalmente abalados.

Viverão com amargura

e a sua memória perecerá.


Os ímpios perante o destino dos justos (2,10-20)

20Quando se pedir contas dos seus pecados, virão aterrorizados,

e os seus pecados se levantarão contra eles para os acusar.

Capítulo 5

1Então, com grande confiança, o justo se levantará

face aos que os oprimiram

e desprezaram as suas obras.

2Ao verem-no, serão abalados por um horrível temor

e ficarão estupefactos com a sua inesperada salvação.

3Dirão entre si, arrependidos,

gemendo na angústia da sua alma:

4«Este é aquele de quem nós ou­trora escarnecemos

e a quem loucamente cobrimos de opróbrio!

Insensatos de nós, que conside­rámos a sua vida uma loucura

e a sua morte uma vergonha!

5Como é ele contado entre os fi­lhos de Deus

e partilha da sorte dos santos?

6Assim, extraviámo-nos do cami­nho da verdade,

a luz da justiça não brilhou para nós

e o Sol não se levantou sobre nós.

7Andámos pelas sendas da mal­dade e da perdição,

vagueámos pelos desertos sem ca­­­minhos

e ignorámos o caminho do Senhor!

8Que proveito tirámos do nosso or­gulho,

e de que nos serviu a riqueza e a arrogância?

9Tudo isso desapareceu como a sombra,

como uma sombra que passa,

10como um navio que vai cor­tan­do as ondas agitadas,

sem deixar rasto da sua passa­gem

nem vestígio da sua quilha nas ondas.

11Ou como a ave que voa pelos ares,

sem deixar sinal do seu voo;

bate o ar com as asas,

fende-o com a força do seu im­pulso,

atravessa-o com o mover das suas asas,

sem deixar rasto da sua passa­gem.

12Ou como a seta atirada ao alvo,

que fende o ar, mas este logo se une,

ignorando-se, depois, a trajectó­ria seguida.

13Assim também nós: mal nasce­mos, logo desaparecemos,

sem poder mostrar rasto de vir­tude.

Fomos consumidos pela nossa pró­pria maldade.»

14Sim, a esperança do ímpio é como poeira levada pelo vento,

como leve espuma espalhada pela tempestade,

como fumo dissipado pela aragem

e como lembrança do hóspede de um dia que passa.


Destino glorioso do justo e cas­tigo do ímpio

15Mas os justos viverão eterna­mente,

o Senhor os recompensará

e o Altíssimo cuidará deles.

16Por isso, receberão um reino de glória

e um diadema brilhante da mão do Senhor;

com a sua direita os protegerá

e com o seu braço os defenderá.

17Tomará o seu zelo como arma­dura

e armará a criação para castigar os seus inimigos.

18Tomará por couraça a justiça,

e por capacete o juízo sincero.

19Tomará a santidade como um es­cudo invencível.

20Afiará a sua ira para lhe ser­vir de espada,

e todo o universo lutará com Ele contra os insensatos.

21Os raios sairão como setas cer­teiras desferidas das nuvens,

como de um arco bem distendido voarão para o alvo.

22Uma funda lançará uma vio­len­ta saraivada,

a água do mar se enfurecerá con­tra eles,

e os rios os arrastarão sem pie­dade.

23Um vento poderoso investirá con­­tra eles

e como um furacão os dispersará.

A maldade fará de toda a terra um deserto,

e a iniquidade arrasará os tronos dos poderosos!

Capítulo 6

Os governantes e a sabedo­ria (Pr 8,15-16; Rm 13,1-7)

1Ouvi, pois, ó reis, e entendei;

aprendei, ó vós que governais em toda a terra!

2Prestai ouvidos, vós que reinais sobre as multidões

e vos gloriais do número dos vos­sos povos!

3Porque do Senhor recebestes o poder,

e a soberania vem do Altíssimo,

que julgará as vossas obras

e examinará os vossos pensa­men­­tos.

4Pois, sendo ministros do reino, não governastes com rectidão

nem respeitastes a Lei,

nem seguistes a vontade de Deus.

5De modo terrível e inesperado,

Ele vos aparecerá,

pois um julgamento rigoroso será feito aos grandes.

6O pequeno, com efeito, encon­trará misericórdia,

mas os poderosos serão exami­na­dos com rigor.

7O Senhor de todos não temerá ninguém

nem se intimidará com a gran­deza,

pois Ele criou o pequeno e o gran­de

e de todos cuida igualmente.

8Mas, para os poderosos, o julga­mento será severo.

9A vós, pois, ó reis, se dirigem as minhas palavras

para que aprendais a sabedoria e não pequeis.

10Aqueles que se conduzem se­gundo as leis santas

serão reconhecidos como santos,

e os que se deixam instruir por elas, nelas encontrarão a sua defesa.

11Ansiai, pois, pelas minhas pala­vras,

desejai-as ardentemente e sereis instruídos.


A sabedoria deixa-se encontrar (Pr 1,20-21; 8,1-21; Sir 6,26-29)

12Radiante e inalterável é a sabe­doria;

facilmente se deixa ver por aque­les que a amam,

e encontrar por aqueles que a buscam.

13Antecipa-se a manifestar-se aos que a desejam.

14Quem por ela madruga não se can­sará:

há-de encontrá-la sentada à sua porta.

15Meditar nela é prudência con­su­mada,

e aquele que não dorme por causa dela

depressa estará livre de inquie­tação.

16Pois ela própria vai à procura dos que são dignos dela,

pelos caminhos lhes aparece com benevolência

e vai ao encontro deles, em cada um dos seus pensamentos.

17O princípio da sabedoria é o sin­cero desejo de ser instruído por ela,

e desejar instruir-se é já amá-la.

18Mas amá-la é obedecer às suas leis,

e obedecer às suas leis é garantia de incorruptibilidade.

19E a incorruptibilidade aproxima-nos de Deus.

20Desta forma, o desejo da sabe­do­ria conduz à realeza!

21Portanto, ó senhores dos povos, se quereis tronos e ceptros,

honrai a sabedoria e reinareis para sempre.


Elogio da sabedoria (Jb 10,8-12; Sl 139,13-16; Sir 10,1-5)

22Eu vou anunciar-vos o que é a sabedoria e qual a sua origem,

sem vos esconder os seus segre­dos.

Desde a sua origem mais remota a investigarei

e porei a claro o seu conheci­mento,

sem me afastar da verdade.

23Não caminharei com aquele que se consome de inveja,

pois esta nada tem a ver com a sabedoria.

24A multidão dos sábios é a sal­vação do mundo

e um rei sábio é o bem-estar do povo.

25Deixai-vos, pois, instruir pelas mi­­nhas palavras

e delas tirareis grande proveito.

Capítulo 7

Salomão, um simples ho­mem

1Também eu sou um homem mor­tal como todos os homens,

descendente do primeiro que foi formado da terra,

e no ventre de uma mãe fui feito carne.

2Durante dez meses fui ganhan­do corpo no sangue,

a partir do sémen do homem e do prazer conjugal.

3Também eu, ao nascer, respirei o ar comum

e, como todos, caí sobre uma ter­ra de sofrimento

e, como todos, a primeira coisa que fiz foi chorar.

4Criaram-me com mimos entre cuei­ros.

5Nenhum rei começou de outro modo a sua existência,

6pois, para todos, é igual o começo e o fim da vida.


Estima da sabedoria (9; 1 Rs 3,6-12; 5,9-14; Sir 47,12-17)

7Por isso pedi, e foi-me dada a in­teligência;

supliquei, e veio a mim o espírito de sabedoria.

8Preferi-a aos ceptros e aos tro­nos,

e, em comparação com ela, vi que não eram nada as riquezas.

9Nem sequer a comparei às pe­dras preciosas,

pois o ouro todo, diante dela, é um pouco de areia,

e a prata, perante ela, será como lodo.

10Amei-a mais que a saúde e a be­leza,

e antes a quis ter a ela que a luz,

pois a sua claridade jamais tem ocaso.

11Com ela me vieram todos os bens,

e nas suas mãos está uma ri­queza incalculável.

12Deliciei-me com todos estes bens,

pois é a sabedoria quem os con­duz,

mas eu ignorava que ela fosse a sua mãe.

13Aprendi-a com simplicidade, re­parto-a sem reservas

e não escondo a sua riqueza,

14porque ela é para os homens um tesouro inesgotável;

os que a adquirem tornam-se agra­­­dáveis a Deus,

e recomendáveis a Ele pelos dons da instrução.


Salomão pede a Deus a sabe­doria (1 Rs 5,9-14)

15Que Deus me permita falar com inteligência

e ter pensamentos dignos dos dons concedidos,

pois é Ele quem guia a sabedoria

e quem dirige os sábios.

16Em suas mãos estamos nós e as nossas palavras,

toda a inteligência e toda a habi­lidade.

17Foi Ele quem me deu a verda­deira ciência das coisas

para conhecer a estrutura do uni­verso e a propriedade dos ele­mentos:

18o princípio, o fim e o meio dos tempos,

a alternância dos solstícios e a sucessão das estações,

19os ciclos do ano e as posições dos astros,

20a natureza dos animais e os ins­tintos das feras,

o poder dos espíritos e os pensa­mentos dos homens,

a variedade das plantas e as vir­tudes das raízes.

21Conheci tudo o que está oculto ou manifesto,

pois a sabedoria, artífice de tudo, mo ensinou.


Natureza e propriedades da sabe­doria

22Com efeito, há nela um espí­rito inte­ligente e santo,

único, múltiplo e subtil,

ágil, penetrante e puro,

límpido, invulnerável, amigo do bem e perspicaz,

23livre, benéfico e amigo dos ho­mens,

estável, firme e sereno,

que tudo pode e tudo vê,

que penetra todos os espíritos,

os inteligentes, os puros e os mais subtis.

24A sabedoria é mais ágil que todo o movimento

e por sua pureza tudo atravessa e penetra.

25Ela é um sopro do poder de Deus,

uma irradiação pura da glória do Omnipotente,

pelo que nada de impuro entra nela.

26Ela é um reflexo da luz eterna,

um espelho imaculado da activi­dade de Deus

e uma imagem da sua bondade.

27Sendo uma só, tudo pode;

permanecendo em si mesma, tudo renova;

e, derramando-se nas almas san­tas de cada geração,

ela forma amigos de Deus e pro­fetas,

28pois Deus só ama quem vive com a sabedoria.

29Ela é mais radiante que o Sol,

e supera todas as constelações;

comparada com a luz, sai vence­dora,

30pois a luz dá lugar à noite,

mas sobre a sabedoria não preva­lece o mal.

Capítulo 8

1Ela estende-se com vigor de uma extremidade à outra

e tudo governa com bondade.


A sabedoria, esposa ideal

2Eu a amei e busquei desde a mi­nha juventude,

procurei tomá-la por esposa

e enamorei-me da sua formo­sura.

3A sua intimidade com Deus pro­clama a nobreza da sua ori­gem,

pois o Senhor do universo a amou.

4É que ela está iniciada na ciên­cia de Deus

e é ela quem escolhe as suas obras.

5E se a riqueza é um bem dese­jável na vida,

que há de mais rico que a sabe­doria, que tudo pode?

6E se é a inteligência que opera,

quem mais que ela é artífice de todas as coisas?

7E se alguém ama a justiça

tem como seus frutos as virtudes,

pois ela ensina temperança e pru­dência,

justiça e fortaleza.

E nada há mais útil que isto para os homens.

8Se alguém deseja uma vasta ex­periência,

ela conhece o passado e adivinha o futuro,

penetra as subtilezas da lingua­gem e a chave dos enigmas,

prevê sinais e prodígios

e o desfecho das idades e dos tempos.

9Por isso, resolvi tomá-la por com­panheira da minha vida,

sabendo que ela será para mim conselheira do bem

e consolação nas preocupações e nas tristezas.

10Graças a ela, alcançarei glória en­tre as multidões

e, embora jovem, gozarei do respeito dos anciãos.

11Ser-me-á reconhecida perspi­cá­cia nos julgamentos

e farei a admiração dos pode­ro­sos.

12Se me calar, esperarão que fale;

se falar, escutar-me-ão atenta­mente;

se me alargar no discurso,

ficarão cheios de admiração.

13Graças a ela, alcançarei a imor­ta­lidade

e deixarei para a posteridade uma memória eterna.

14Governarei povos, e as nações me serão submetidas.

15Os tiranos temíveis, ao ouvir-me, assustar-se-ão.

Com o povo, mostrar-me-ei amá­vel e corajoso na guerra.

16Ao regressar a casa, repousarei ao lado dela,

pois o seu convívio não tem nada de desagradável

nem a sua intimidade é aborre­cida,

mas apenas deleite e alegria.


A sabedoria é puro dom de Deus

17Reflectindo eu sobre estas coisas

e meditando em meu coração

que a imortalidade está em união com a sabedoria;

18que na sua amizade existe um no­bre prazer;

que na obra das suas mãos há uma riqueza inesgotável;

que há inteligência na assidui­dade da sua companhia

e celebridade no diálogo com ela,

ia por toda a parte procurando possuí-la.

19Eu era um jovem de boas qua­lidades,

que tinha recebido uma alma boa;

20ou melhor, como era bom, vim para um corpo sem mancha.

21Sabendo, porém, que não a al­can­çaria,

se Deus não ma concedesse

e já era inteligência saber de quem vinha o dom –

dirigi-me ao Senhor e rezei,

dizendo de todo o coração:

Capítulo 9

Salomão implora a sabedoria (1 Rs 3,6-9; 2 Cr 1,7-10; Pr 8,27-30)

1«Deus dos nossos pais e Senhor de misericórdia,

que tudo criaste pela tua pala­vra,

2que formaste o homem pela tua sabedoria,

a fim de que dominasse sobre to­das as criaturas que cha­maste à existência,

3governasse o mundo com santi­dade e justiça

e exercesse o julgamento com rec­tidão de espírito,

4dá-me a sabedoria que se senta junto do teu trono

e não me excluas do número dos teus filhos.

5Pois eu sou teu servo e filho da tua serva,

homem débil e de vida breve,

incapaz de compreender a justiça e as leis.

6Mesmo que alguém fosse per­feito entre os homens,

sem a sabedoria que vem de ti, seria nada.

7Tu me escolheste como rei do teu povo,

como juiz dos teus filhos e filhas.

8Tu me mandaste construir um templo no teu monte santo

e um altar na cidade da tua mo­rada,

à imitação da tenda santa que preparaste desde o princípio.

9Contigo está a sabedoria, que co­nhece as tuas obras,

que estava presente quando fa­zias o mundo,

e que sabe o que é agradável a teus olhos

e o que é recto segundo os teus mandamentos.

10Envia-a, pois, do teu santo céu,

digna-te enviá-la do trono da tua glória,

para que me assista nos meus tra­­balhos,

e eu conheça aquilo que te é agra­dável.

11Pois ela sabe e compreende tudo,

guiará os meus actos com pru­dência

e me protegerá com a sua glória.

12Assim, as minhas obras te se­rão agradáveis,

governarei o teu povo com justiça

e serei digno do trono de meu pai.

13Pois que homem poderia conhe­cer a vontade de Deus?

Quem poderá imaginar o que pre­tende o Senhor?

14Os pensamentos dos mortais são hesitantes,

e incertas as nossas reflexões;

15porque o corpo corruptível é um peso para a alma,

e esta tenda terrena oprime a mente cheia de cuidados.

16Mal podemos entender o que há sobre a terra

e o que está ao nosso alcance dificilmente o descobrimos;

quem poderá, pois, compreender o que há no Céu?

17E quem conhecerá a tua von­tade, se não lhe deres a sabedoria,

e não enviares o teu santo espí­rito lá do Céu?

18Assim se endireitaram as vere­das dos que vivem na terra,

os homens aprenderam o que é do teu agrado

e pela sabedoria se salvaram.»

Capítulo 10

1Foi ela quem protegeu o pri­meiro homem, pai do mundo,

quando ele estava só,

e o salvou do seu próprio pecado;

2e deu-lhe poder para dominar so­bre todas as coisas.

3Mas quando, na sua ira, um ho­mem injusto se afastou dela,

pereceu pelo seu furor fratricida.

4Quando, por causa dele, foi inun­dada a terra,

a sabedoria novamente a salvou,

conduzindo o justo numa frágil embarcação.

5E quando as nações, unidas no mal, foram confundidas,

foi ela quem reconheceu o justo,

e o manteve irrepreensível dian­te de Deus

e lhe deu forças para vencer o afecto para com o filho.

6Também, aquando da destrui­ção dos ímpios,

foi ela quem salvou o justo que fugia do fogo que caía sobre a Pen­tápole.

7Testemunho desta perversi­dade

é ainda uma terra fumegante e deserta,

e árvores de frutos que não ama­durecem;

e, como memorial de uma alma incrédula, está lá uma estátua de sal.

8Pois, por terem desprezado a sa­be­doria,

não só foram privados de conhe­cer o bem,

mas também legaram à história um testemunho da sua insen­satez,

para que os seus pecados não fi­cassem esquecidos.

9A sabedoria, porém, livrou des­ses sofrimentos os seus fiéis.

10Quando o justo fugia da ira do seu irmão,

foi ela quem o guiou por cami­nhos rectos,

lhe mostrou a realeza de Deus

e lhe deu o conhecimento das coi­sas santas;

ela coroou de êxito as suas tare­fas

e fez frutificar os seus trabalhos.

11Assistiu-o contra a cupidez dos opressores

e o cumulou de riquezas;

12protegeu-o dos seus inimigos,

e o defendeu de quantos o ata­cavam;

após um duro combate, deu-lhe a vitória,

para lhe ensinar que a piedade é mais poderosa que tudo.

13Quando o justo foi vendido, ela também não o abandonou,

antes o preservou do pecado.

14Desceu com ele à cisterna

e não o deixou em suas cadeias,

até lhe entregar o ceptro real

e o poder sobre os seus opres­so­res.

Desmascarou os que o difama­vam

e deu-lhe uma glória eterna.


A sabedoria guiou Moisés (Ex 7-15)

15Foi ela que livrou o povo santo, raça irrepreensível,

de uma nação de opressores.

16Entrou na alma do servo do Se­nhor

e opôs-se a reis poderosos com si­nais e prodígios.

17Deu aos santos o prémio dos seus trabalhos

e conduziu-os por um caminho cheio de prodígios;

de dia, ela serviu-lhes de sombra

e, de noite, de astro flamejante.

18Fê-los atravessar o Mar Verme­lho,

e os conduziu por águas cauda­lo­­sas.

19Submergiu os seus inimigos

e depois, do fundo do abismo, lan­çou fora os seus cadáveres.

20Por isso, os justos despojaram os ímpios,

celebraram, Senhor, o teu nome santo,

e louvaram, a uma só voz, a tua mão protectora.

21Porque a sabedoria abriu a boca dos mudos

e tornou eloquente a língua das crianças.

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